A pandemia de Covid-19 ultrapassou o número de mortes pela gripe espanhola de 1918. No mundo, Estados Unidos e Brasil foram os países com maior número de casos e mortes. Entretanto, em Okinawa, no Japão, houve baixa mortalidade pela doença. Da mesma forma, na África Subsaariana foram encontrados menores índices de mortalidade e infecção em comparação com países do Norte da África, Europa e América do Norte. E a resposta pode estar na alimentação porque, embora essas populações tenham contextos geopolíticos e socioeconômicos muito distintos, os hábitos alimentares são semelhantes.
Em ambas as regiões a população tem uma dieta baseada em vegetais e baixa incidência de doenças crônicas, como a síndrome metabólica, o que provavelmente favoreceu a menor mortalidade por Covid-19. Okinawa, por exemplo, é conhecida pela longevidade da população graças ao estilo de vida e à reduzida frequência de doenças. Por outro lado, populações que consomem uma dieta rica em alimentos de origem animal, com altas quantidades de gorduras saturadas e alimentos ultraprocessados, apresentam maior prevalência de doenças cardiometabólicas.
Sob a hipótese de que a dieta à base de plantas ou dieta vegetariana pode estar associada a uma menor incidência e gravidade da infecção por Covid-19, pesquisadores brasileiros realizaram um estudo com voluntários. O objetivo era avaliar a influência dos padrões alimentares na incidência e evolução da doença. No estudo, denominado Projeto Pandora, adultos foram recrutados durante o período de 18 de março a 22 de julho de 2022.
Alimentação conta
Inicialmente, os participantes receberam um questionário on-line sobre dados sociodemográficos, estilo de vida, histórico médico, padrões e hábitos alimentares. Depois, foram divididos em dois grupos: 424 voluntários compunham o grupo onívoros, que consumiam algum alimento de origem animal, enquanto 278 tinham dietas baseadas em vegetais. Neste caso, foram incluídos os flexitarianos/semi-vegetarianos, lacto-ovo-vegetarianos e vegetarianos estritos ou veganos. Ambos os grupos foram solicitados a manter um acompanhamento mínimo de seis meses.
“Descobrimos que brasileiros que consumiam uma dieta baseada em vegetais, principalmente uma dieta vegetariana, tiveram menor incidência de Covid-19, mesmo após considerar variáveis importantes como atividade física, índice de massa corporal e condições pré-existentes”, explica o pesquisador responsável Julio César Acosta Navarro. Médico do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (InCor/HC/FMUSP), o pesquisador acentua que aqueles que relataram seguir dietas baseadas em vegetais ou dietas vegetarianas tiveram uma maior ingestão de vegetais, legumes e nozes, e menor ingestão de laticínios e carnes
Imunidade
De acordo com os achados, a associação entre dieta vegetariana e Covid leve tem relação com a imunidade. Isso porque o sistema imunológico utiliza uma série de mecanismos de defesa para combater infecções. Portanto, é necessário ter uma quantidade adequada de enzimas antioxidantes, vitaminas e peptídeos pois, sem eles, a capacidade do sistema imunológico será comprometida. “Devido à alta ingestão de alguns nutrientes e fitoquímicos essenciais em grupos que seguem dietas baseadas em vegetais, é plausível que uma diferença no estado imunológico possa ser observada entre padrões alimentares baseados em vegetais e onívoros”, sugere o pesquisador.
Os padrões alimentares baseados em vegetais são ricos em antioxidantes, fitoesteróis e polifenóis. E esses elementos afetam positivamente vários tipos de células implicadas na função imunológica, assim como exibem propriedades antivirais diretas. Na literatura, há consenso de que uma dieta vegetariana adequadamente planejada é saudável e nutricionalmente adequada.
Ademais, pode proporcionar benefícios à saúde para a prevenção e o tratamento de certas doenças. Além disso, pessoas vegetarianas têm risco reduzido de doenças crônicas de alta morbidade e mortalidade, incluindo doença cardíaca isquêmica, diabetes tipo 2, hipertensão, certos tipos de câncer e obesidade. O estudo ‘Vegetarian and plant-based diets associated with lower incidence of Covid-19’ foi publicado em janeiro de 2024 no BMJ Nutrition, Prevention & Health.